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15 de maio de 2023
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PASTORAL 1945

PASTORAL – 1945

Rev. João Rodrigues Bicas

Amados irmãos

            A graça de nosso Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus de Pai e a comunhão do Espírito sejam para sempre convosco. Amém.

            Pareceu bem ao Espírito Santo, assim como ao Presbitério, dirigir-vos a presente pastoral, que traduza os sentimentos do próprio concílio, para vossa reafirmação de princípios, firmeza na fé e vida piedosa, num como protesto contra a impiedade, a profanação e o mundanismo.

            O mundo está a entrar numa nova fase de reconstrução universal, depois do tremendo flagelo da guerra. É justo, pois, que, ao longo da reconstrução econômica e política, se proceda também à reconstrução espiritual: religiosa e doutrinária, sem o que o mais será impossível. Importa que a nossa fé religiosa esteja ligada a doutrinas ortodoxas bem nítidas em vosso espírito e em vosso coração, em vista da nossa finalidade eclesiástica.

Imortalidade – A imortalidade é a glória do homem. Tirai a imortalidade do homem, e não vereis nele mais do que um simples animal. Aviltam a natureza humana, esses que consideram a morte como o último marco de nossa existência. Porém, vós que tendes horror a esse pensamento que tanto nos deprime, segundo os ditames da razão e da verdade, credes que fostes criados para a eternidade. Nutri essa sublime idéia e aspirai a felicidade que nunca terá fim, pois são verdades proclamadas pela Palavra de Deus. Os apóstolos contemplam o homem como um ser imortal. Este é o aspecto sob o qual aparecem constantemente as diversas condições da vida humana, num desejo incontido de continuar a viver.

            Esta é a aspiração da alma, porque com tal propósito e possibilidade foi criada por Deus. Já outrora dizia, e com muito acerto o coronel Ângelo Blanco, perante o tumulo de Dom Eudoro Dias de Vivar, na província de Corrientes: “Eu não sei, senhores, se a morte é o fim da vida ou apenas o começo da outra.” Dissemos, com muito acerto, porque era a compreensão que o orador tinha acerca do assunto. Porém, nós podemos dizer: Bem sabemos, porque Cristo nos tem falado sobre o assunto com toda a clareza.

            A nossa fé cria uma certeza, que não padece dúvida. Entendemos, com o máximo acerto, porque é o testemunho do texto inspirado, e não só de um coração emocionado no momento: “Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do Homem vos dará, porque a este selou o Pai, Deus.” São palavras de Jesus Cristo, de quem o próprio Ângelo Blanco devia ter colhido ensinos, para não alimentar dúvidas. São essas dúvidas e descrenças que têm produzido as cisões no evangelismo mundial. E a Igreja Presbiteriana Conservadora do Brasil tem uma grande responsabilidade – que é a de afirmar princípios eternos, motivo por que, ela deve exercer as boas influências, defendendo-se contra as más. O grande apóstolo das gentes dizia outrora: “Eu sei em quem tenho crido, e estou bem certo que é poderoso, para guardar o meu tesouro, até o dia final.”

Revelação – Nós, como fundamentalistas, sustentamos que a Bíblia é a Palavra de Deus.

            A um mundo tomado de guerras, nadando em sangue, enleado de intrigas, foi que o profeta Isaías disse: “Seca-se a erva, cai a flor, mas, a Palavra do Senhor subsistirá para sempre.” Nesse tempo havia apenas a lei de Moisés; mas, já se esboçavam o começo dos Salmos e outros escritos sagrados, que, periodicamente, foram coligidos e codificados no seio da nação israelita, vindo até ao período áureo do cristianismo, de tal modo a ser transformado em um Monumento indispensável, concebido como revelado pelo Espírito Santo, ou Jeová, como concebiam os judeus, na primeira parte do Velho Testamento, por não terem ainda visão clara acerca da doutrina da Trindade. “Havendo Deus antigamente falado muitas vezes, e em muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos nestes últimos dias nestes últimos dias pelo Filho.” A história da Bíblia consubstancia gloriosamente as predições de Isaías. É impossível conceber-se que as Escrituras Sagradas caiam fora de uso, ou venham a ser esquecidas, em virtude de seu conteúdo preencher as necessidades das nossas almas. Esta concepção universal a seu respeito indica que elas não são simplesmente palavra de homem, mas, sim, que são a Palavra de Deus, que subsistirá para sempre. “Mas a palavra do Senhor permanece eternamente. Esta é a palavra que vos foi evangelizada.” (1Pe 1.25). Esta Bíblia, encerrando os seus 66 livros, formou-se de há muito, o cânon sagrado. É ela a Palavra de Deus, e não somente contém a Palavra de Deus. É Deus falando conosco, em todas as suas partes e não somente numa parte. É revelação plenária e não parcial. Não é sem razão que São Paulo afirmou: “Toda a Escritura divinamente inspirada é útil par ensinar, para repreender, para corrigir e para instruir na justiça.” (2Tm 3.16). E não se imagine que seus escritores foram tomados do Espírito Santo, a ponto de perderem a sua consciência e a sua vontade. Na verdadeira profecia nunca o inspirado perde a consciência e a vontade. Ouçamos o que diz o apóstolo S. Paulo: “E os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas.” (1Co 14.32)

A Divindade de Cristo – Este é o maior acontecimento da história humana, até agora visto. A divindade de Jesus prende-se ao seu nascimento miraculoso, e sobrenatural. Em primeiro lugar, esse nascimento foi profetizado. Desde os primórdios do Velho Testamento, foi predito que o Cristo, o Messias de Israel, no cumprimento dos tempos, devia vir. Esse que devia vir, é chamado por três nomes: “Filho, Verbo e Imagem”; ora, nós sabemos, como fundamentalistas, que Jesus Cristo é o Filho de Deus, num sentido em que só Ele é, e não no sentido em que todos nós o somos. Nele se combinam a divindade e a humanidade. Isto fez arrancar da mente pensadora de Anselmo a célebre frase, “Cur Deus Homo”, ou seja “Porque o Deus Homem”, que é tópico de um dos mais belos capítulos da teologia. Que esse sentido seja um tanto misterioso, pouco importa. A Bíblia o afirma, e nós com ela podemos afirmar. “Porque agora vemos por espelho em enigma, mas, então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido.” (1Co 13.12). É o mesmo que se faz na ciência. Desta, não se disse ainda a última palavra, mas isto não serve de razão para não se aproveitar o que dela está conhecido. Se assim se age com a ciência deste mundo, porque não agir também assim na ciência divina? “Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz duma terra seca, não tinha parecer nem formosura; e olhando nós para ele, não havia aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais indigno entre os homens, homens de dores, e experimentado nos trabalhos; e como um de quem os homens escondiam o rosto era desprezado, e não fizemos dele caso algum. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido.” (Is 53.2-4). É o que dele se disse no 6º século antes da sua vinda. E quando, no ano 90 da era cristã, S. João iniciava o seu evangelho, suas primeiras palavras foram de que ele era Deus, e de que ele estava com Deus: “No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus.” (Jo 1.1). Isto leva-nos a crer, finalmente, que a palavra pessoa, que empregamos em nossa língua, para denominar as partes da Trindade, é a única que mais se aproxima, dado o fato de Jesus Cristo ser Ingênito, ou não gerado, como o simplesmente humano o é. Fiquemos com a Palavra de Deus e aceitemos pela fé o que se prende ao mistério. Nunca tenhamos a tentação de querer explicar tudo, somente pelas luzes da razão. “Disse-lhes Jesus: Porque me viste, Tomé, creste? Bem-aventurado os que não viram e creram.” (Jo 20.29)

O Homem – O homem é um pecador, caído do primitivo estado de retidão e separado da graça redentora de Deus, irremediavelmente perdido. Seu fim principal é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre. Sem o toque da graça divina, jamais poderá tornar à comunhão com o Pai Criador. “Miserável homem que sou eu! Quem me livrará do corpo desta morte?” “Eu faço o que não quero, e o que quero não posso fazer.” (Rm 7.16, 19 e 24). Porém, Deus na sua infinita misericórdia, desde toda a eternidade, resolveu salvar os que quiserem crer no seu Filho, como única fonte de salvação. “Porque Deus amou o mundo de tal maneira, que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.” (Jo 3.16)

            E como o homem nunca poderá vencer sem que vença por Cristo, ele tem de ouvir o que disse Jesus Cristo: “Tende bom ânimo, eu venci o mundo.” (Jo 16.33). Uma predisposição atenciosa, para com Jesus Cristo e suas promessas, preparará o terreno, para que, este homem não seja o descrito por S. Paulo, em 1 Co 2.14 “Porque o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porquanto se discernem espiritualmente.” Ciente, ao menos, que tem uma alma, que necessita de salvação, se sincero, procurará saber se é um dos escolhidos do Senhor, e se Este, pelo seu misterioso processo, está lhe falando à alma, e neste caso, é ele um dos descritos por S. Paulo, no verso 15 do mesmo capítulo e da mesma epístola: “Porém, o homem espiritual discerne bem todas as coisas.” Ao perceber a pessoa teantrópica de Cristo, sua alma procurará investigar o porque das duas naturezas, no Filho de Deus, e este amor do Pai, que lhe foi votado primeiro, constrangerá a alma a um tão grande salvador. O homem virá a ter uma compreensão clara do que disse nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo em São João 15.5 “Vós sem mim nada podeis fazer.” Assim, diante da Palavra de Deus, não nos é possível alimentar a idéia de que o homem possa levantar-se do seu estado pecaminoso sem a intervenção divina.

A Expiação – É nesse princípio fundamental que a morte de Jesus Cristo foi expiatória em virtude de Ele ser sem pecado, por Ele mesmo não necessitando morrer. “Quem dentre vós me convence de pecado?” (Jo 8.46) e “Esta é uma palavra fiel e digna de toda aceitação, que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores, dos quais eu sou o principal.” (1Tm 1.15). Expiação, doutrinariamente falando, é a satisfação oferecida a Deus pelo culpado, em reparação da sua falta. A justiça divina é perfeita e exige essa satisfação. Como ao homem, agora pecador e imperfeito em todas as coisas, não lhe assiste aquela perfeição, que possa satisfazer a essa justiça, tornou-se necessária a morte expiatória de Cristo. “Sabendo que fostes resgatados das vossas práticas vãs que por tradição recebestes de vossos pais, não por coisas corruptíveis, como o ouro ou a prata, mas pelo sangue precioso de Cristo, como de cordeiro sem defeito e imaculado, conhecido na verdade antes da fundação do mundo, mas manifestado no fim dos tempos por amor de vós.” (1Pe 1.18). O Filho de Deus encarnando-se e sofrendo por nós, tomou sobre si a dívida e demasiadamente a pagou. É a expiação por excelência, a que desarma a justiça de Deus e repara o ultraje feito à sua santidade pelos pecados dos homens. Todavia, para que ela seja realmente eficaz para nós, urge que cada um tome a cruz, segundo a palavra evangélica, e a leve após o Redentor; isto é, que o pecador se deve aplicar os méritos de Cristo. A idéia de expiação já existia nas religiões da antiguidade, tal como apaziguar o céu, que julgavam ofendido. Os judeus, em particular, celebravam todos os anos uma festa especial denominada a festa da expiação: “Disse mais Jeová a Moisés: Mas aos dez dias deste sétimo mês é o dia da expiação: será para vós uma santa convocação, e afligireis as vossas almas; oferecereis uma oferta queimada a Jeová.” (Lv 23.26,27). Mas, esta festa nada mais era, do que um monumento histórico e profético, da verdadeira expiação, feita por Cristo, na Cruz do Calvário. Pois, de acontecimentos históricos e proféticos, e de personagens tipos de Cristo e de seus feitos, o Velho Testamento está cheio. Já houve mesmo quem tivesse o capricho de escrever uma obra, sobre estes trechos do Velho Testamento, dando-lhes o título: “Cristo é Tudo.” E daí partimos para esta afirmativa sem par: A expiação realizada por Cristo, não achou, nem achará similar. Urge, pois, que cada membro da Igreja Presbiteriana Conservadora do Brasil cuide destas doutrinas, e perceba que, a sua sustentação implica em nossa existência eclesiástica. “Guarda o que te foi confiado.” (1Tm 6.20). Implica igualmente o dever de um procedimento coerente com tais princípios, na esfera moral e na esfera religiosa, como cristãos e como cidadãos, segundo o ensino de Jesus, em sua exortação, de caráter prático: “Se sabeis estas coisas, bem-aventurados sereis se as praticardes.” “A graça seja convosco!” São Paulo, 1º de julho de 1945.

Ass. João Rodrigues Bicas, Francisco Augusto Pereira Júnior, Armando Pinto de Oliveira, Armando Rosa, Roberto Hecht, Alfredo Alípio do Vale, Rafael Camacho, Alceu Moreira Pinto, Pedro Boerim, Antonio Euclides Cavalheiro, Adelino Rodrigues de Oliveira, Luiz Jorge, Joaquim Sebastião de Souza Melo, Salomão Pereira de Carvalho, Azor José Rodrigues, Florêncio Fernandes Reis, José Palone, Horácio Bueno Gonçalves, Horácio Pereira, José Garcia Barbosa, Abílio Costa Ribeiro.