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BIOGRAFIA DE Antonio Luiz de Jesus Cerqueira
28 de abril de 2021
A FIDELIDADE, A MISERICÓRDIA E O AMOR DE DEUS

por Rev. Jaziel C. Cunha

Introdução

As Escrituras mostram que Deus é fiel à sua palavra. Ele é fiel à sua aliança. As Escrituras falando da aliança que Deus fez com Abraão relatam a atitude que o Senhor tomou. Ver Gn 15. 7-20. Veja que só o Senhor passou. Por que será? Já pensaste nisto? Existem outros textos que nos falam sobre a fidelidade do Senhor Nm 23.19; Dt 7.9; Sl 89.33; Is 49.7; 1Co 1.9; 2 Tm 2.13; Hb 6.17-18; 10.23. Luis Berkhof definindo a fidelidade do Senhor diz o seguinte:

Há ainda outro aspecto dessa perfeição divina, e um aspecto sempre considerado da maior importância. Geralmente se lhe chama Fidelidade, em virtude da qual Ele está sempre atento à Sua aliança e cumpre todas as promessas que fez ao Seu povo. Essa fidelidade de Deus é de máxima significação pratica para o povo de Deus. É à base da sua confiança, o fundamento da sua esperança, e a causa do seu regozijo. Ele os salva do desespero ao qual a sua própria infidelidade facilmente os poderia levar, dá-lhes coragem para prosseguirem, a despeito de todos os seus fracassos, e enche os seus corações de jubilosas antecipações, mesmo quando estão profundamente cônscios do fato de que perderam o direito a todas as bênçãos de Deus1

A fidelidade de Deus é um aspecto da veracidade de Deus, os crentes podem descansar, pois sabem que Deus não pode mentir, e se prometeu, certamente cumprirá. Uma das coisas que os profetas falavam quando o povo sofria era que aquilo que estava acontecendo era decorrente do juízo de Deus, todavia, o Senhor também falava de restauração. Mq. 7:18-20; Amós 9. 13-15: Ez 36. 16-37.

Quando uma aliança é estabelecida espera-se o cumprimento por ambas as partes. Sendo assim a fidelidade é essencial para que possa haver aliança. Um exemplo disto é o casamento.

Eichrodt faz o seguinte comentário:

Enquanto comunidade baseada em uma aliança, a relação de Israel com Deus também conhece conteúdos relacionados com essa forma da vida jurídica, ainda quando modificadas pela grandeza do pactuante divino. Aqui também a estipulação da aliança levava intimamente semelhante à fiel predisposição a um mútuo serviço leal como conduta exigida pela relação estabelecida; sem a referência à hesed por ambas as partes era impensável a manutenção da aliança.2

A aliança nas Escrituras fundamenta-se na obediência. A aliança é estruturada em cima de um tratado que consta das partes integrantes, de suas obrigações e de cláusulas de vida e de morte.

Surge uma questão: Se Deus entrou em aliança conosco e se quebramos as cláusulas qual a razão da nossa esperança?

A grande questão é que todos os estágios de aliança são desdobramentos de uma única aliança, que, segundo cremos, fora feita entre Deus (Representando a Santíssima Trindade) e Cristo Encarnado (Representando os eleitos de Deus).

Sem Cristo não tem como entender a fidelidade de Deus com seu povo. Se Deus foi fiel aos santos do Antigo Testamento, do Novo Testamento e a todos os santos de todas as épocas posteriores, tudo isto se deve ao fato de ter Cristo obedecido de forma satisfatória os preceitos da aliança.  L. Berkhof faz o seguinte comentário:

Na aliança da Redenção, Cristo se encarregou de expiar os pecados do Seu povo, sofrendo pessoalmente a punição necessária e de satisfazer as exigências da lei pelo mesmo povo. E, ao tomar o lugar do homem delinqüente, Ele se fez o ultimo Adão e, como tal, é o Chefe da aliança, o Representante de todos quantos o Pai lhe deu.3

Interessante também observar que Cristo não poderia falhar e o cumprimento da aliança por parte Dele tinha que ser perfeito. Pessoalmente creio que Jesus nunca correu o risco de falhar, pois se houvesse a possibilidade de falha, como Deus poderia ser fiel aos representados que viveram antes de Cristo nascer? Cremos que é por causa da impossibilidade do Senhor Jesus falhar que Yahweh foi Fiel ao seu povo do Antigo Testamento. Por isso, que os santos de Deus já experimentavam misericórdia. Pois Deus é fiel. Vendo por este prisma, percebemos que tudo é graça, até os castigos. Hebreus 12.11.

Por causa disto, o povo de Deus tem a convicção bem arraigada que Ele virá em seu auxílio e que podem esperar pela bondade de Yahweh em suas vidas. E mesmo quando castigados, sabem que não é o fim.

Eichrodt fazendo um comentário sobre os poderosos atos libertários de Yahweh pelo seu povo diz o seguinte:

Assim como a salvação do Egito foi interpretada por um feito nascido desse amor solícito, assim também o Deus do Sinai, com todo seu terrível poder, e ó Deus amoroso e disposto a prestar seu auxílio, o Deus que permanece fiel a sua promessas e faz intervir seu singular poder em prol do povo da aliança.4

Depois que o povo adorou o bezerro de ouro o Senhor falou algo para Moisés que se constituiu em uma das maiores crises vividas pelo povo. Deus disse: “Sobe para uma terra que mana leite e mel; eu não subirei no meio de ti, porque és povo de dura cerviz, para que te não consuma eu no caminho.” Êxodo 33. 3. O que esta ação de Deus representa? Vemos na continuação o significado e a percepção que o povo teve.“Ouvindo o povo estas más notícias, pôs-se a prantear, e nenhum deles vestiu seus atavios. Porquanto o SENHOR tinha dito a Moisés: Dize aos filhos de Israel: És povo de dura cerviz; se por um momento eu subir no meio de ti, te consumirei; tira, pois, de ti os atavios, para que eu saiba o que te hei de fazer.  Então, os filhos de Israel tiraram de si os seus atavios desde o monte Horebe em diante.” (Êxodo 33. 4-6).

O que eram os atavios? Vestes festivais associadas com a idolatria. Van Groningen em seu livro diz “a prescrição de Yahweh para a adoração excluía completamente qualquer aspecto da idolatria pagã.”5 Por que o povo teve esta atitude? O Anjo do Senhor que é o próprio Senhor (Êx. 23. 20-23) não iria na frente deles? A questão era cúltica. Em Êxodo 25. 8-9 nos é dito que o Senhor manda construir um tabernáculo visando habitar no meio do povo. Em Êx. 29. 44-46 nos é dito: Consagrarei a tenda da congregação e o altar; também santificarei Arão e seus filhos, para que me oficiem como sacerdotes.  E habitarei no meio dos filhos de Israel e serei o seu Deus. E saberão que eu sou o SENHOR, seu Deus, que os tirou da terra do Egito, para habitar no meio deles; eu sou o SENHOR, seu Deus.  O fato de o Senhor ter dito que não subiria transmitia a ideia de que não aceitaria mais culto deles. Mas, acontece algo, Moisés roga ao Senhor. Disse Moisés ao SENHOR: Tu me dizes: Faze subir este povo, porém não me deste saber a quem hás de enviar comigo; contudo, disseste: Conheço-te pelo teu nome; também achaste graça aos meus olhos. Agora, pois, se achei graça aos teus olhos, rogo-te que me faças saber neste momento o teu caminho, para que eu te conheça e ache graça aos teus olhos; e considera que esta nação é teu povo. Respondeu-lhe: A minha presença irá contigo, e eu te darei descanso. Então, lhe disse Moisés: Se a tua presença não vai comigo, não nos faças subir deste lugar. Pois como se há de saber que achamos graça aos teus olhos, eu e o teu povo? Não é, porventura, em andares conosco, de maneira que somos separados, eu e o teu povo, de todos os povos da terra? Êxodo 33.15-16. Moisés especifica neste verso o que é achar graça diante de Deus. Não tem como continuar peregrinando se Deus não for conosco. Não poderia haver vida sem a presença graciosa de Yahweh. Observem que não é questão de proteção, livramento e êxito. Eles não tinham o Anjo na sua frente? A questão era a presença graciosa de Yahweh no culto. No Texto de Êxodo 34.6-7 nos é dito o seguinte: “E, passando o SENHOR por diante dele, clamou: SENHOR, SENHOR Deus compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fidelidade; que guarda a misericórdia em mil gerações, que perdoa a iniqüidade, a transgressão e o pecado, ainda que não inocenta o culpado, e visita a iniqüidade dos pais nos filhos e nos filhos dos filhos, até à terceira e quarta geração!”Van Groningen falando deste trecho, diz “ O que se segue à repetição do seu nome é a explicação de Yahweh do seu amor, que é a característica abrangente do seu próprio ser (I João 4.16)”6

A manifestação do amor de Yahweh pelo seu povo se torna manifesta em toda a história da Igreja, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento. Qual a causa de tão intenso amor? Qual a causa de tão intensa fidelidade?

A causa é a aliança feita entre Deus e Cristo. Por isso, todos os representados por Cristo experimentam este amor intenso de Yahweh. E esta intensidade é descrita na compaixão de Deus pelo seu povo. Van Groningen diz: “Yahweh ama intensamente; ele ama como uma mãe ama o filho que foi formado no seu ventre. A idéia transmitida é a de suavidade, ternura, gentileza motivadas por uma feição profunda”7

Vendo a aliança de uma forma completa entendemos o grande amor demonstrado a nós tanto pelo Pai, pelo Filho e pelo Espírito Santo. O amor de Deus é manifesto na vida dos seus santos em todas as épocas. Deus jamais desampara seu povo, a inimizade fora removida. A reconciliação é promovida, pois antes de sermos chamados, éramos inimigos de Deus. Ridderbos falando sobre a pregação de Paulo diz:

Em tudo isso, inteiramente de acordo com o grande tema fundamental da pregação de Paulo, a reconciliação é a obra da redenção que vem de Deus, em Cristo, para o mundo, para a remoção da inimizade para a restauração da paz8

Fizemos algo para sermos merecedores deste amor? Não! O que poderíamos fazer? Éramos mortos em delitos, reprovávamos suas obras. O amor de Deus pelos seus santos é maravilhoso. O texto de Romanos 5.8 diz “Mas Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores.”

Eichrodt diz que “em Oséias, encontramos a expressão de amor mais rica e mais profunda de todo o Antigo Testamento.”9 E esta expressão é a do matrimônio. Quando lemos Oséias e seu relacionamento com sua esposa, o qual retrata a situação do esposo Yahweh e sua esposa Igreja. Percebemos o terrível pecado da infidelidade pactual contra Deus. O amor de Deus é assombroso, pois apesar dos nossos pecados, seu amor por nós continua da mesma forma. Eichrodt diz algo que no meu modo de ver é relevante e deve nos levar ao raciocínio

Mas essa demonstração da idéia de amor na história está muito longe de transformar o amor de Deus em um principio racional, em algo assim como uma lei ética do universo. Esse processo se evita acentuando fortemente o paradoxo inexplicável da capacidade amorosa de Deus, que se descreve como o cortejo a uma prostituta, ou seja, como algo até grotesco, uma conduta que choca tanto à moral quanto ao direito, e também afirmando com a mesma intensidade e paixão na ira divina que jamais encontrou tons mais altos em outro profeta. (Oséias) O amor indignado de Deus é exposto integralmente, em toda sua realidade paradoxal, e até alcança a profundidade de uma luta dentro do mesmo Deus que aparece sofrendo e desconcertado pela falta de amor de seu povo (Os. 11.8; 6.4). A luta acaba com a vitória do amor (11.9)10

Como Deus prova seu amor para seu povo? A Escritura diz que “Deus prova o seu próprio amor para conosco pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores” Romanos 5.8. Qual é a idéia do texto?

Deus é fiel ao seu povo por causa de seu Nome. O Senhor vela por seu nome. Em Ezequiel 36. 16-21 a Escritura diz: “Veio a mim a palavra do SENHOR, dizendo: Filho do homem, quando os da casa de Israel habitavam na sua terra, eles a contaminaram com os seus caminhos e as suas ações; como a imundícia de uma mulher em sua menstruação, tal era o seu caminho perante mim. Derramei, pois, o meu furor sobre eles, por causa do sangue que derramaram sobre a terra e por causa dos seus ídolos com que a contaminaram. Espalhei-os entre as nações, e foram derramados pelas terras; segundo os seus caminhos e segundo os seus feitos, eu os julguei. Em chegando às nações para onde foram, profanaram o meu santo nome, pois deles se dizia: São estes o povo do SENHOR, porém tiveram de sair da terra dele. Mas tive compaixão do meu santo nome, que a casa de Israel profanou entre as nações para onde foi.”

Qual a causa de ser Deus fiel? A resposta se dá quando consideramos quem foi a outra parte contratante da aliança. Berkhof em sua teologia diz o seguinte:

Os que identificam a aliança da redenção e a aliança da graça e consideram antibíblico distinguir entre ambas, naturalmente entende que a aliança primeiramente foi estabelecida com Cristo como o Chefe representante dos que o Pai lhe deu, aliança na qual Ele se fez Fiador dos eleitos e, assim, garantiu a sua redenção completa.11

Cristo é a razão do amor de Deus por nós. Ele é a outra parte da aliança.  O amor de Deus é para todos? Não! O texto de João 3.36 é bem especifico “Por isso, quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se mantém rebelde contra o Filho não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus”. O verbo permanece “me,nei” é um indicativo presente ativo. A ideia é permanecendo. A voz do verbo é ativa, ou seja, Deus está irado. Porque Deus está irado? Por que eles não creram. E qual a razão de não crer? Por que Cristo não os representa. As Escrituras dizem: “Manifestei o teu nome aos homens que me deste do mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra”. João 17.6. O verbo manifestei “VEfane,rwsa,” é um indicativo aoristo ativo. O indicativo aponta para uma ação real e concreta, o aoristo é considerado tempo no passado e fala de uma ação já completa. O verbo e;dwkaj “confiastes” é um indicativo aoristo ativo. Ou seja, é uma ação passada e completa. Deus não está dando mais ninguém a Jesus, Ele já deu de forma completa e definitiva. O número dos eleitos é fixo. Ninguém entra e  ninguém sai. O texto continua dizendo que eles têm guardado a palavra. João usou um verbo para guardar “teth,rhkan” este verbo é um indicativo perfeito. Ou seja, a guarda da palavra é contínua. Não existe a possibilidade do eleito deixar de guardar a palavra. A lógica é simples: Jesus é seu representante, Deus é fiel a Jesus, Deus honra seu Nome, os eleitos já foram escolhidos e dados a Cristo. Todos aqueles que o Senhor chamou, guardam a sua palavra, neles habitam o Selo e Penhor da sua salvação, o Espírito Santo. “em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa; o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória.” Efésios 1.13-14. O verbo “evsfragi,sqhte” fostes selados é um indicativo aoristo passivo, ou seja, o selo é uma ação completa, é um ato histórico que não se repeti. A voz é passiva, ou seja, o homem sofre a ação.

O amor de Deus salvífico só é para os eleitos. Só por eles é que Cristo morreu “e andai em amor, como também Cristo nos amou e se entregou a si mesmo por nós, como oferta e sacrifício a Deus, em aroma suave”.  Efésios 5.2 A preposição u`pe.r “por” + o pronome u`mw/n “nós” ambos estão no genitivo que transmitem a idéia de posse. O próprio verso diz de quem somos propriedade. Cristo nos amou “hvga,phsen”amou, este verbo é um  indicativo aoristo ativo, ou seja, o amor de Cristo por mim é um ato completo e ativo. A prova deste amor de Cristo é que Ele se entregou “pare,dwken”este verbo é um indicativo aoristo ativo, ou seja, a sua entrega é um ato completo e histórico que não pode se repetir. Por ser sua propriedade, Cristo faz isto por mim. Qual a razão de Cristo fazer isto? Existia um preço a ser pago. Ridderbos diz o seguinte no seu livro:

A idéia de Mediador que aparece juntamente com essas palavras (em 1Tm 2.6) designa Cristo como representante autorizado tanto de Deus quanto dos homens. É ele quem representa Deus para os homens e os homens para Deus. Nessa última função ele oferece o pagamento do resgate. A raiz dessa ideia encontra-se no antigo costume legal judaico apresentando na lei de acordo com o qual era possível dar um resgate pela vida condenada (cf. Êx. 31.30) 12

Deus só demonstra seu amor salvífico por àqueles que Jesus pagou seu preço, que seus pecados foram cancelados e a ira que eles mereciam fora satisfeita.

Ridderbos diz “Deus mostra sua justiça vindicativa no presente e, assim, justifica aqueles que têm fé em Jesus (Rm 3.25,26)”.13

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Notas:

  1. BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo-SP: Cultura Cristã. 2001. p. 68
  2. EICHRODT, Walther. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo-SP: HAGNOS, 2005 p205
  3. BERKHOF op.cit. p.248
  4. EICHRODT op.cit. p. 205-206
  5. GRONINGEN, Gerard Van. Criação e Consumação Vol. I. São Paulo-SP: Cultura Cristã, 2006. p. 412
  6. Id. Ibid. p. 409
  7. Id. Ibid. p. 409
  8. RIDDERBOS, Herman. A Teologia do Apóstolo Paulo. São Paulo-SP: Cultura Cristã, 2004. p. 208
  9. EICHRODT, op.cit p. 222
  10. Id. Ibid. p. 223
  11. BERKHOF, op.cit p. 254
  12. RIDDERBOS, op.cit p. 217
  13. Id. Ibid. p. 211